“Ou então cada paisano e cada capataz
Com sua burrice fará jorrar sangue demais
Nos pantanais, nas cidades, caatingas e nos gerais”
(Caetano Veloso)
No começo todo mundo achou o máximo. O gigante
finalmente acordou! Agora a coisa vai! Vai pra aonde cara pálida? O gigante que
foi pras ruas virou um boneco desgovernado - antes fosse um fantoche,
manipulado por alguém que se saberia quem era. O gigante transformou-se em uma
massa disforme que de tanto atirar pra todos os lados atingiu a todos,
inclusive a si próprio.
As discussões
começam quando se tenta colocar pontos cardeais na tendência política dos
movimentos. É de direita, é de esquerda, é extrema disso, reacionária daquilo.
Mas aí começam as perguntas: Em uma manifestação, dos presentes, quantos sabem
se posicionar politicamente?
Vamos começar
pelos nossos partidos, quem está em cada fatia desse bolo? Eu particularmente
tô perdidinho. Quem eu pensava que era de um lado se mostra do outro, quem eu
achava que era do outro faz coisa do lado oposto.
A culpa é do
governo. É o que todos dizem pra jogar a batata quente na mão de alguém. Mas
que governo? Federal, estadual ou municipal? Não interessa. A culpa é do
governo e vamos botar pra quebrar. Literalmente. A desculpa depois é dizer que
foram manifestações isoladas de pessoas que se infiltraram no movimento para
desestabilizar as manifestações.
O que não era
só pelos vinte centavos tá virando, não é só pelo patrimônio depredado, não é
só pelo estabelecimento comercial particular saqueado, não é só pela vida de um
trabalhador acabada... Virou casa de mãe joana, com “j” em minúsculo mesmo.
Em nome de uma
tal democracia onde tudo pode, só não pode proibir, cada setor competente do
estado que tire o seu da reta e quem estiver na alça de mira que se vire.
Quando o estado de direito não faz direito o seu papel, o primeiro espertinho
que aparece tira a venda de Têmis, chuta a sua balança e faz a vez de estado.
É assim na
comunidade, onde o traficante que manda no pedaço, resolve os problemas dos
moradores locais – um médico, uma cesta básica, um emprego – mas por outro lado
faz as próprias leis, julga e executa; é assim no meio da floresta com os
grileiros; em diversas profissões com os cartéis; e não seria diferente no meio
da rua com os “black blocs”, com os mascarados, com os rolezeiros, com os
“Anonymous”, com os justiceiros de plantão ou até com os manifestantes de causa
verdadeira. Onde os poderes do estado estão podres, qualquer poder paralelo
pode até parecer saudável, mas, por ser ilegítimo, já nasce putrefato.
Protesto,
passeata, rolezinho, reivindicação, manifestação, tumultuo, baderna,
quebradeira, linchamento, morte, tragédia. Como começa até pode se saber, aonde
vai desembocar, Deus sabe
Um país onde
os interesses eleitoreiros da esmagadora maioria dos partidos políticos estão
infinitamente acima dos interesses da nação e da população, só pode dar nisso;
um país onde a corrupção é praga, mas dependendo da ocasião ela é até
justificada por alguns – que até se reúnem para pagar pela pena pecuniária
alheia - não pode ser diferente; um país onde, na justiça, o pau que dá em
Chico não toca em um dedo de Francisco, não pode caminhar em outra direção; um
país onde reclamar da corrupção alheia é obrigação, mas furar fila, dar uma
grana pro guarda aliviar, comprar produto pirata, falsificar carteira de
estudante, receber troco a maior e não devolver é a coisa mais natural do
mundo, não pode acabar bem.
Confesso que
não sei qual a solução para esta zorra que virou nosso Brasil velho de guerra.
Já quebraram muito, já badernaram demais, já atrapalharam a vida de muita gente
e de muitas coisas; agora começou a morrer gente, e de graça. Gente de bem,
trabalhador, gente da tão temida mídia. A coisa tá começando a feder. É bom que
providências sejam tomadas logo. Urgente! Agora! E por quem de direito.Senão,
depois de feder já sabe: finda dando em merda. E das grandes.
* Título da canção de Caetano Veloso que prefacia o texto