Tive que ir ao Rio às pressas.
Uma tia minha, já de idade e adoentada, precisava de acompanhamento diário e
não poderia mais ficar morando sozinha na capital fluminense. A tarefa dada era
trazer a titia pra passar uma temporada em Natal, colocar a saúde dela em dia e
depois pensar em um futuro seguro e tranquilo aqui ou lá no Rio de Janeiro
mesmo.
Peguei o primeiro vôo disponível, o que no caso
vinha a ser um na madrugada, chegando na cidade maravilhosa cedo da manhã.
Durmo muito pouco quando viajo. Não apenas pela nítida desproporção entre o meu
desproporcional e espaçoso corpo, a cadeira do avião e sua falta de espaço para
a parte do corpo que não fica sentada nela, mas principalmente pelo medo
terrível que tenho de pegar no sono e acontecer duas coisas:
Primeiro:
Roncar. Existe uma lenda, contada principalmente por minha esposa, que ronco.
Eu particularmente não acredito nisso, nunca presenciei tal fato, tirando uma,
ou melhor duas, ou não mais que três vezes que lembro ter acordado com um som
aparentado a um ronco que supostamente teria saído de mim. Acho que foi sonho.
Mas é fato que
morro de medo de cair no sono e não deixar a aeronave inteira dormir com meu
estrondoso ruído ressonador. Me vejo sendo acordado pela aeromoça pedindo pela
paz de todos que eu pare de roncar. Imagino a cara ameaçadora dos meus vizinhos
de cadeira insones. Não consigo relaxar e dormir tranquilamente, para a
tranquilidade geral da nação.
A segunda
coisa é o medo de que, para aninhar o sono, eu me aninhe com o passageiro da
poltrona ao lado. Explico. Só durmo “de conchinha” com minha Karlinha, e me
imagino acordando tentando encaixar a perna com a perna do careca ao lado, ou
ainda, levando um tabefe da velhinha da cadeira do meio, depois que eu puxei o
corpo dela para junto do meu, dei uma “bicoca” de boa noite e pedi pra ela
virar pra eu poder encaixar o meu corpo na bundinha dela.
Por essas e
outras melhor não dormir, até porque tô na poltrona da janela, o careca da do
corredor ronca mais que um porco e a velhinha da cadeira ao lado da minha, em
sono profundo, já tentou me puxar umas duas vezes pra eu me aninhar com ela.
Melhor ficar alerta...
... Deus do
céu! Peguei no sono! Acordo atordoado com o comandante mandando a tripulação se
preparar para o pouso. O careca continua roncando, a velhinha acabou de acordar
e me olhou com uma cara de cumplicidade que prefiro nem imaginar o porquê. Do
lado de fora da janela o Rio se exibe lindo como sempre e passada a noite
tenebrosa é hora de cumprir o que me incumbe.
Mas isso é
papo para outras linhas...