quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

Chapeuzinho Vermelho – A versão do pai


O tema não é meu, confesso. Foi coisa do meu professor de língua portuguesa. Mas vou usá-lo aqui fazendo algumas adaptações.
A ideia central desta história que vou contar é sobre a ideia central do famoso conto infantil de Chapeuzinho Vermelho, de autoria de Charles Perrault e com a posterior versão fabular de final feliz dos inspirados irmãos Grimm. Pense numa dupla pra gostar de “com fabular”.
Na versão inicial de Perrault, Chapeuzinho, uma menina bonita, é mandada pela mãe para ir entregar uns doces para a vovozinha que está doente. Antes de sair, ela alerta a criança para ter cuidado no percurso, não falar com estranhos e todas aquelas recomendações de mãe, além do que, se sabia da existência de um lobo mau por aquelas bandas. No caminho a menina encontra um lobo que, como ela não nota a sua maldade, passa-lhe o maior xaveco, descobre o endereço da velha, chega lá antes de Chapéu e inhack! Come a velha – no sentido literal do verbo.
Depois ele fica esperando a menina dentro da casa da finada vovó, tem toda aquela história de deita na cama, isso é grande, aquilo também, isso é pra isso, aquilo é pra aquilo, ai que “meda”! Inhack! Papa a menina de sobremesa e pronto, “c’est fini”. Sem caçador, sem abertura de barriga pra retirada de todo mundo lá de dentro e todo esse final cirúrgico e feliz que conhecemos. Isso já foi coisa dos irmãos alemães, que adoravam um final alegre, uma moral da história e assim por diante.
O mais interessante nisso tudo são as versões sobre o cerne deste conto. Além da quase unânime de que não se deve desobedecer a mãe porque sempre dá em merda - aquela velha história de praga de mãe – tem várias outras vertentes que falam de moral, sexualidade e perda da inocência.
Alguns sustentam que Chapeuzinho não seria tão “inho” assim, que já era uma quase adolescente, que deu muita trela pro lobo, que teria se insinuado, chegando alguns a dizer que aquela história de comer não deve se levar no sentido literal e por aí vai.
Eu particularmente só acho muito estranha essa história de doces. Pense bem: uma velhinha que está muito doente ao invés de receber remédios, frutas da época, comida saudável, vai receber guloseimas. Será que estavam querendo curar ou matar logo a coitada da senhora da terceira ou quarta idade?
Mas a que mais me chamou a atenção foi a versão contada, e só agora encontrada, pelo pai de chapeuzinho. Depois da mal contada história da comida e da retirada das duas inteiras de dentro da barriga do lobo - que por incrível que pareça sobreviveu ao procedimento cirúrgico sem nenhuma sequela – ele relata que a culpa de toda essa história foi da desnaturada da mãe da inocente criancinha. E explica. Veja o texto dele sobre o que aconteceu depois do narrado no conto:
“Logo que saí daquela cena fui direto pro conselho tutelar. Isso não vai ficar assim. Cheguei lá e contei tudo. É uma megera, uma irresponsável a mãe dessa menina. Por isso me separei dela. É uma pena que ela ficou com a guarda de minha filha. Ficou pra não cuidar. Ano passado ela foi reprovada por falta. Quase nunca ia pra escola. A mãe falava que ela vivia doente, mas soube que ela ficava em casa fazendo os afazeres domésticos enquanto a mãe saía pra vadiar. Como não consegui provar nada, nada pude fazer.”
“Veja só, um caminho que é esquisito pra mim, cheio de boca de fumo, de marginal, esquisito pra caralho, ela manda a pobre criança atravessar só pra levar uma ruma de doce praquela velha ranzinha. Isso tudo no horário da escola. Irresponsabilidade dupla. Além de expor a menina ao perigo, o que de fato aconteceu, ainda faz ela perder aula. Isso sem falar que era só pretexto pra ficar sozinha com os machos dela”
“Mas isso não vai ficar assim não! Já falei com meu novo advogado. Agora é tudo ou nada, ou melhor, é tudo. Ele já me mostrou o Estatuto da Criança e do Adolescente, o Código Civil, o Penal, a Constituição e um monte de decisões em casos parecidos. Não tem nem como perder. Vou ganhar de volta a guarda de minha pequena Chapeuzinho, processar a mãe dela por não cuidar de minha filha direito, vou botar esse tal Lobo na cadeia por sedução de menor e ainda deve sobrar alguma pra esse caçador, que essa chegada dele do nada ta muito estranha. Eu ainda vou descobrir a dele.”
“Eu nem queria falar nisso, mas vou ter que contar. Conheci a mãe dela na zona, num puteiro. Sabe como é, findei ficando com pena, voltando, me apegando e aí levei lá pra casa, pra morar comigo. Mas ela sempre foi desse jeito, saidinha, saliente. Eu saia de casa pra trabalhar e ela enchia a casa de gente, principalmente homem. Eu achava estranho, mas, sabe como é... Eu reclamava e ela jurava que aquilo era normal, que eram só amigos de longas datas, me dava um cheirinho, fazia um chamego e eu deixava pra lá.”
“Espere aí, acho que tô me lembrando de um detalhe, esse tal de Lobo era um dos frequentadores lá de casa. Acho até que tenho uma foto dessa turma toda lá em casa no aniversário de sete anos de Chapeuzinho. Fudeu geral. Cafetina, prostituta dos infernos. Querendo aliciar a própria filha. E com certeza aquela velha coroca alcovitava essas safadezas todas.”
“Pois é isso, seu conselheiro. Por isso tudo, vim aqui no conselho tutelar da floresta pra denunciar esse povo todo, principalmente a minha ex. Ela agora anda com um papo que é tudo culpa de Charles Perrault e dos irmãos Grimm, mas é tudo culpa dela. Safada. Covarde. Quenga. Tome logo as providências que a menina não volta mais pra casa da mãe nem a pau Juvenal!”
E afinal, no que deu essa versão? Que final, afinal? Não tenho a mínima ideia. A bem da verdade a única moral dessa minha história é que é melhor não ficar arranjando moral pras histórias de seu ninguém. Eles que são brancos – ou vermelhos no caso – que se entendam.